segunda-feira, 1 de julho de 2013

TOLÁTÁLÔ

Lavão ou melhor Sr. Olavo e sua esposa Anete, jamais esperaram passar por aquele pânico angustiante. Embora a pequena Eva Ananda já fosse peralta o suficiente para torná-los vigias constantes de cada gesto dela, apesar daquela minúscula boneca loira contar apenas 3 anos de idade, uma simples distração e ambos estavam profundamente arrependidos de não notar que ela já aprendera a mexer naquele antiquado ferrolho da porta de entrada. O minúsculo projeto de liderança feminina, trancara o acesso à residencia com os pais para o lado de fora, justamente quando eles saiam para visitar o caçula internado com pneumonia. O caso é que os dois pequenos, na semana anterior, haviam desaparecido e reaparecido 15 minutos depois, ele com  febre e ela espirrando. Os pais viram uma revista de "Fotografias de Todo o Globo", que caída ao chão, apresentava um poster mostrando a paisagem branca da antártica com pinguins imperadores. Ao ver os dois tilintando de frio, seu Lavão perguntou nervoso:
 -Eva Ananda Candres, onde você estava com o teu irmãozinho?
 -Levei ele pra vê pinguim, ué? Mais num gostei. Muito frio, voltei logo, a...a... atchim!
 -Anete, disse Olavo, aquece esses meninos, eles tem gelo nos cabelos e nas roupas!                                
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 -Olavo chegou a boca ao buraco da fechadura e chamou:
 -Evinha! Abre a porta pro papai, abre?
 -Num abru!
 -Abre meu doce de cabelo de anjo, pra mim! Dizia dona Anete.
 -Tamem num abru!
 -Porque docinho, porque? E enquanto a mãe falava com a menina, o pai levava a grande escada do quintal para ganhar o acesso ao quarto de cima.
 -Purque eu vô imbora. Já to com meu dinhero.
 -Não vá quebrar seu porquinho de louça, foi sua avó que te deu!
 -É meu i si eu quisé  eu quebro pra usa o dinhero!
 -E onde você vai que precisa de dinheiro?
 -Tô braba, não gosto mais de vocês. Vô pra Austrália! Vocês brigaro comigo. Falaro que eu dexei meu irmãozinho doente, mas não fui eu, já falei, ele escorregou e caiu de costa no gelo. Nesse momento a mãe não ouviu mais a voz da filha.
 Lavão conseguira empurrar a janela do quarto por fora. Sorte ter deixado a tramela aberta, pois permitiu que com muita dificuldade pela largura da passagem e alguns machucados e  palavrões, ele conseguisse ganhar o interior da casa.Um cheiro que já lhe era familiar, com tudo estranho, um aroma de almíscar levemente ácido, inundava a sala de onde a criança se recusara a abrir a porta. Resquícios de uma névoa leitoso dourada se espargia à frente do sofá e a menina, onde? Ele correu abrir a porta para a esposa que entrou aflita, mas que logo se desesperou com a notícia: a menina desaparecera. Lembranças surgiram ao casal de desde o primeiro ano do nascimento dela. Com 1 ano ela sumiu do berço e foi encontrada  no jardim. Com 2 anos sumiu com o caçula de 1 ano e reapareceu sozinha. Quando perguntaram onde estava o irmão ela respondeu:
 -Na minha queche.
 -Como na sua creche? Perguntaram os dois.
 -Levei pra brincá cos amiguinho.
 Em seguida o telefone tocou:
 -Seu Olavo?
 -Sou eu!
 -É muito estranho, mas o senhor pegou a Evinha aqui e a levou. Uma hora depois ela estava aqui de novo com o irmãozinho. Quando eu fui falar com ela, ela sumiu e o seu filhinho ficou aqui!
 Outros incidentes aconteceram como o do dia em que ela foi sequestrada e enquanto os sequestradores combinavam o preço do resgate pelo telefone com dona Ivete ela puxou a saia da mãe:
 -Cum quem cê tá falando?
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 Os dois então, se deram as mãos e disseram em uníssono:
 -E agora, o que vamos fazer?
 Ela foi rezar, ele guardar a escada. Sem dizer mais nenhuma palavra, sabiam intimamente que não tinham nada a fazer a não ser esperar. Sentaram-se no sofá, onde a tinham visto deitada pela última vez através do buraco da fechadura, quando na tentativa de que ela abrisse a porta diziam:
 -Abre a porta amor! Tem um gatinho bonitinho aqui!
 -Num tem gatinhu não, dizia ela olhando pela mesma fechadura, num vô abri, falei qui tô braba, eu não dexei meu irmãozinho doente e pronto! E voltava, e deitava no sofá pondo o cofrinho em cima da barriga. Choraram, choraram muito, choraram juntos numa aflição que durou 3 horas, quando ela reapareceu:
 -Oi, quis voltá! Gosto di vocês. Num tô mais braba. Sadade! Vamo vê meu irmãozinho?
 -Onde você estava, filha? Dizia o pai.
 -Não faz mais isso com a mamãe, amor! Dizia a mãe.
 -Fui na Austrália, já falei!
 Os pais notaram o cofrinho em uma mão e... pelos na outra? Olavo tirou os pelos da mão da filha, correu à cozinha e guardou-os num saquinho plástico.
 -Você nem sabe o que é Austrália, minha filha! Você nunca viu!
 -Ví sim, ta na fotrogafia, olha aqui, pegou a revista, abriu numa página e mostrou o porto de Sidney, depois da praia com essa casa grande com seis ponta, fui pra selva e andei de canguru. E abriu outra página ainda no capítulo da Austrália, e mostrou os cangurus.
 Dona Anete se ajoelhou em lágrimas e implorou:
 -Evinha, nunca mais faça isso ou então, sua mãe vai morrer de desgosto! Ela disse essa frase com tanto sentimento que Evinha tomou um choque. Nunca vira a mãe chorar daquele jeito.
 Sr. Olavo levou os pelos que havia acondicionado no saquinho plástico para um amigo biólogo que analisou, discutiu o resultado com veterinários e pesquisadores e a conclusão foi inegável: eram verdadeiramente pelos de canguru. Depois do resultado positivo do exame, o pai deu um susto maior ainda na pequerrucha, dizendo que se ela continua-se fazendo aquilo, viriam uns homens loiros e sardentos e de cabelos vermelhos, americanos maus, que iriam leva-la para os Estados Unidos e cortar o corpinho e abrir a cabeça dela para saber o que tinha dentro. Ela abriu o berreiro, parou um pouco e perguntou:
 -O que é sarnento?
 -Sarnento é quem pega uma doença chamada sarna que da coceira e deixa a pele feia e fedida, mas eu falei sardento, que é homem que tem a pele pintadinha, cheia de pintinhas pequeninhas. A pequenina disse:
-Ah...tá, uáááá´, eu num faço mais, num faço mais!
  Esse susto, fez acontecer alguma coisa com a pequena porque realmente, o fenômeno parou de acontecer.
  O caçulinha enfim recuperou-se da pneumonia e voltou para a casa.
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 Os anos então, correram tranquilos sem incidendentes dignos de menção. Eva Ananda conheceu Flávio, um psicólogo muito centrado, casaram-se, nasceram Ana Lua, a Analu e depois José Paulo o "dabadinho", porque os pais o chamavam de danadinho, palavra que Analu não sabia falar. Nossa heroina conseguira então, realizar todos os seus sonhos. Estava realizada profissionalmente, amorosamente e finalmente era mãe, e de um belo casal de filhos. Como estava feliz, sua natureza biológica e paranormal retornou. Primeiro foi aquele cheiro levemente ácido de almíscar que ela sentia, depois pontos luminoso dourados se espargindo em filetes leitosos cor de ouro. Ela começava a vislumbrar um outro lugar, ao mesmo tempo que via o lugar onde estava. Um dia, querendo estar com o esposo, Flávio, apareceu dentro do banheiro do consultório dele. Quando saiu, abriu a porta e deu de cara com ele:
 -O que você faz aqui? Disse Flávio.
 -Não sei? Tive saudade de você e de repente, me vi aqui! Disse Eva.
 -Então é verdade...tudo o que você me contou é absurdo mas agora estou tendo as provas!
 -Que provas?
 -Você acha que eu já não observei? Frequentemente você está trancada no banheiro e em seguida te vejo na cozinha. Um dia deixei você deitada para eu socorrer a Analu que estava tendo um pesadelo, quando abri a porta do quarto,você já estava lá.Por isso andei pesquisando:Você tem a faculdade de se teletransportar! É, como no "Jornada nas Estrelas", com a diferença de que no filme existe um equipamento e você tem isso em si, é natural. Não lute contra isso mas aprenda a controlar. Sem você saber, ouvindo as histórias sobre os fenômenos que lhe aconteceram, eu estudei e pesquisei muito sobre o assunto, começando essa busca por informações pertinentes ao assunto, um ano após termos nos conhecido. Colhi depoimentos fiz experimentos e descobri uma outra pessoa que sofre o mesmo fenômeno. O  teu caso é muito raro, mas nem por isso deixou de ser comum a poucos dos grandes vultos da história. Pesquisas levantaram teorias quase afirmativas de que o vulgo Jack, o estripador, nuca foi encontrado por controlar o mesmo poder.. Terrível, não? Já para o lado do bem, como você acha que Da Vinci tinha tanta sabedoria? É claro que ele era inegavelmente um gênio, contudo ele também possuía essa faculdade e a utilizava para estudar em escolas e com professores de lugares extremamente distantes e em fração de segundos de um ponto a outro de maneira a absorver o melhor do conhecimento em tempo recorde. Desde os tempos imemoriais, apareceram na civilização esses teletransfers sim, você é uma teletransfer. Já desenvolvi uma técnica de indução psíquica para o teu caso.  Eu vou te ajudar.
  Como grande estudioso da mente humana, Flávio submeteu Eva Ananda a tratamento hipnótico até que ela se tranquilizasse e passasse a controlar sua faculdade. Dai em diante foi tudo alegria, ela passou a usar esse dom para tornar sua vida e a dos seus, mais prática e divertida.
  Um dia, ela se preparava para fazer uma dessa viagens, levando os seus pequerruchos:
 -Vamos viajar?
 -Pra onde mãe, disse Analu, eu quero a Disney.
 -Pá ondi mamá? José Paulo observava Analu e repetia o que ela falava, Disny, Disny!
 -Que Disney o que, seus moleques! Já levei vocês lá pelo menos 10 vezes, 20 no Hopi Hari e 50 vezes no parque da Mônica, chega! Vamos para um lugar diferente...que tal a Austrália?
 A campainha tocou. Era Heloisa, uma colega de serviço que já praticamente era de casa:
 -Eva, tô viciada em Zumaº, e o o meu computador pifou. Deixa eu jogar no seu?
 -Claro Heloisa, pode entrar e jogar!
 -Heloisa? Não me lembro a última vez que você me chamou assim!
 -Tá bom Helô, eu vou dar uma saida depois eu volto, pode jogar à vontade.  Heloisa não sabia da sua paranormalidade; aliás, ela, os de casa e seus pais sabiam, falavam e repetiam que ninguém poderia saber, senão seria aquele inferno.
 -Onde você vai, se arrumando assim com os meninos?
 Eva Ananda pensou , pensou e respondeu:
 -Lá. Estou indo até lá esta bem Heloisa?.
 -Eu hein? Não diz onde vai e ainda me responde tão formal assim!
 -Tá bom Helô! Estou indo até lá então fica assim: Estou é tô, lá é lá mesmo, está bem será tá e Helô é Lô! Tô lá, tá lô? Dizendo isso, Ana que já abraçava as crianças, sumiu.
 Heloisa, que já enterrara os olhos no seu jogo Zuma, no computador de Eva, nem notou o desaparecimento em passe de mágica. Só viu no ar aquela névoa leitoso dourada.
 -Que isso? Que cheiro de almíscar! Deixa pra lá se não eu não bato o recorde do jogo.

 º Zuma, jogo de computador em que um sapinho sorrindo com cara de bobo, não para de cuspir esferas coloridas. Cada esfera com sua cor encontrando uma fileira de esferas da mesma cor em fila, explode-as, evitando que a bocarra de uma caveira engula todas as bolas de uma vez, causando a perda do jogo.


  
    






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